Nossa história criou um modelo político excelente para os tempos de Sócrates (uma vítima da Democracia). Muito pouco mudou até há pouco tempo. As cidades aos poucos foram se transformando em pilhas de gente e coisas. Chegamos a um ponto em que é absolutamente necessário colocar ao lado do político, equipes de excelentes profissionais para lhe apoiarem.
Com certeza corremos o risco das “Projarcas” e tecnocracias, mas é fundamental descobrir uma maneira de se compatibilizar desejos com necessidades reais e limitações naturais. A incoerência é flagrante na gerência técnica das cidades.
Nossas cidades (focando nelas, é mais fácil demonstrar) simplesmente carecem de continuidade e seus vereadores e prefeitos demonstram a necessidade de algo mais sólido na administração técnica. É um perigo e uma aberração a forma demagógica, inconstante e incoerente de como são governadas. Tudo isso pode ser explicado de diversas maneiras, mas nosso povo paga uma conta muito alta diante das dificuldades de gestão dos responsáveis pelo governo das cidades, dos estados e da União.
Cada período de mandato é um capítulo desta novela do absurdo. Não temos nem respeito às leis e à própria Constituição Federal. Facilmente descobrimos que a prioridade é oferecer circo, eventualmente pão, com prioridades ditadas por empreiteiros, banqueiros, especuladores e outros sem qualquer ligação com as necessidades reais do nosso povo.
Vemos as catástrofes como oportunidades de fazer caridade, mostrar nosso sentimento cristão, esquecemos que a gravidade desses acidentes demonstram omissões monumentais. Aplaudimos códigos e planos, mas esquecemos de aplicá-los.
Assim, por exemplo, as calçadas são a demonstração do clima absurdo de cuidados da população e do governo. Deveriam merecer mais cuidado que as ruas, afinal os carros têm pneus e podem trafegar até em caminhos de pedra e barro. Não oferecem segurança para os pedestres, pior ainda se forem pessoas com deficiência, idosos, gente com alguma lesão debilitante ou crianças. A resposta de nossas autoridades é a de que elas são de responsabilidade dos proprietários de imóveis, ou seja, de milhares de pessoas nem sempre suficientemente educadas para respeitarem e amarem o próximo.
Não passa pela cabeça de nossos políticos mais próximos e até dos eleitores de que essa lei municipal poderia ser alterada, transferindo para o município uma responsabilidade que deveria ser delegada a algum secretário municipal. Com essa concentração de poder a administração municipal poderia obter financiamentos especiais e desenvolver grandes programas de urbanização, gerando, ainda por luxo, um tremendo mercado de trabalho e valorização da cidade.
Lembrando que sobre os passeios e abaixo deles temos canalizações de água e eletrodutos de concessionárias, orelhões, postes, linhas de transmissão de energia e telecomunicações, árvores e canteiros (para enfeitar e segurar a poluição dos carros, aumentar a permeabilidade do solo etc.), a construção e a manutenção das calçadas poderão ter seus custos divididos entre as concessionárias e as próprias prefeituras, afinal todos ganham com esse benefício, inclusive o pedestre, usuário desses serviços e do transporte coletivo urbano.
Mais ainda, refazer isso tudo seria a oportunidade de aprimoramento de serviços essenciais e correção da bagunça em que se transformaram pela colocação sucessiva de cabos, postes, tubos etc. ao longo dos tempos em que inventaram esses serviços dependentes desses “equipamentos”.
Calçadas ruins, proteção insuficiente aos pedestres e desprezo pela vida de quem precisa caminhar agrava nossas estatísticas de trânsito.
O número de atropelamentos e os acidentes só não são maiores porque nosso povo está se conformando em não caminhar ao longo das ruas das cidades. Sem segurança, sem iluminação adequada, sem caminhos tranquilos, só anda pela cidade quem não tem opção.
O tema, contudo, é coerência técnica, administração técnica.
Como fica, lembrando outro caso preocupante, a coleta de águas pluviais e esgotos em cidades em tempos de crescimento acelerado?
Cada prédio é uma rua vertical, despejando no sistema de drenagem as águas sujas de seus ocupantes, criando sombras e corredores, soltando o calor de dezenas de aparelhos de ar condicionado, despejando dezenas a centenas de automóveis em horários pré-determinados, colocando em arquivos gente que deveria estar conosco.
O medo ocasionado pela ausência de segurança policial talvez seja o principal indutor ao crescimento vertical...
O problema é que estamos em tempos de sustentabilidade, de racionalidade em relação ao meio ambiente. Precisamos desesperadamente de disciplina e muita competência profissional no planejamento e administração das cidades.
Nesse sentido a tragédia é maior observando o agigantamento de cidades em locais que deveriam ter um melhor equilíbrio entre seres humanos e o resto da fauna pré-existente no local, em benefício da flora original, das águas, da qualidade de vida futura.
Devemos e podemos encontrar uma solução democrática para o desafio de existir no século 21.
Cascaes
17.2.2011
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