sexta-feira, 6 de maio de 2011

Bombas residentes

Bombas residentes
Pensei muito antes de escrever este artigo. O tema principal é extremamente delicado, tem significado na área energética e minha vida profissional me obriga a ser responsável ao extremo. Falar de Fukushima é tratar de algo extremamente sério, mais ainda quando nos arrogamos o direito de comentar um acidente catastrófico num país considerado de Primeiro Mundo.
O Japão passou por uma série de tragédias em que tudo o que aconteceu e ainda virá de Fukushima exige atenção especial de todos nós, em todos os seus aspectos e outro maior, que é a urgência de novas técnicas e paradigmas. A sustentabilidade da vida humana depende disso tudo, ou seja, de mudança de comportamentos e maior atenção por planos, projetos, qualidade técnica e operacional, menos lucro monetário e mais responsabilidade social.
Nesse caso o foco principal é a Usina Nuclear de Fukushima (Fukushima I nuclear accidents, 2011). O acidente dessa central de energia elétrica deve nos obrigar a repensar a ousadia tecnológica, quando atinge certos níveis de periculosidade. Demonstrou, mais uma vez, o que é uma usina nuclear construída para produção de energia elétrica, aproveitando as lógicas da fissão nuclear “controlada” e a fragilidade de sistemas que sempre podem ser danificados por omissão, má fé, erro de projeto, causas naturais etc.
Durante algum tempo minha (vou usar a primeira pessoa do singular) preocupação foi entender a diferença entre bombas atômicas e reatores nucleares. No mundo inúmeras bombas foram usadas em testes para “desenvolvimento de novas armas”, e contra alvos civis o Japão teve duas cidades destruídas dessa forma (Hiroshima e Nagasaki). Em imensas áreas de testes artefatos nucleares potentíssimos explodiram durante anos, fruto da histeria bélica criada com a Guerra não muito fria.
Por quê as experiências com bombas atômicas e de hidrogênio causaram poucas vítimas e danos ambientais insignificantes enquanto no Brasil, por exemplo, uma pequena pastilha de material radiativo (Nícoli) matou ou lesionou seriamente dezenas de pessoas e em Chernobyl (USINA NUCLEAR) dezenas de milhares de pessoas acabaram morrendo por efeito inequívoco da radioatividade?
Pensando mais fica evidente a diferença entre bombas e usinas. A quantidade de material contaminado que é lançado na atmosfera por acidentes com usinas ou lixo radioativo exposto explica a violência desses acidentes.
Bombas atômicas e de hidrogênio têm um volume muitíssimo menor de material contaminado que é espalhado na atmosfera do que o criado por um reator instalado em uma usina de energia nuclear que exploda. Pior ainda, no desespero para evitarem a explosão do núcleo, no caso de Fukushima, foram obrigados a jogar água do mar (extremamente corrosiva e condutora de eletricidade) sobre o núcleo criando vapor e sais contaminados...
Ou seja, Fukushima provavelmente inviabilizará a vida humana numa grande área durante décadas e matará muita gente ao longo desse tempo.
O Brasil e muitos outros países estavam retomando a construção de centrais termonucleares.
Onde?
Na década de oitenta tivemos muitas manifestações contra a Usina de Angra dos Reis, afinal Itaorna significa “pedra mole” e diziam que naquela região estávamos sujeitos a terremotos. Angra I já existia e operava mal, era a usina pirilampo, custou caro reformá-la.
Agora temos duas e vamos para a terceira usina no mesmo local.
Assim, com nosso “jeitinho brasileiro”, em uma bela praia entre Rio de Janeiro e São Paulo, à beira mar onde outros fenômenos naturais podem nos trazer maremotos (vimos o que isso significa), teremos mais uma usina atômica. Se algo semelhante ao que aconteceu em Chernobyl se repetir por lá, imporia a evacuação, talvez, de cidades como São Paulo e Rio de Janeiro. Dirão que a probabilidade disso acontecer é pequeníssima, o risco compensa, entretanto? Temos estatísticas públicas, confiáveis? Existe transparência?
Os lobbies industriais e empresariais em geral e o efeito “Ponte do Rio Kway”, um filme que ilustra o envolvimento e a paixão dos homens por suas obras, nem sempre convenientes, podem explicar a insistência em se fazer usinas atômicas no Brasil, isso sem esquecer que temos um complexo industrial específico precisando de encomendas.
É justo?
Vamos para o pré-sal apesar do acidente no Golfo do México e agora para mais usinas nucleares. Será este o caminho? Nossa legislação é razoável? Existe alguma forma de se avaliar contratos, editais, obras etc. de forma segura?
No Brasil, talvez por efeito da ingênua Lei 8.666/93 (Congresso e Poder Executivo Federal) e sua péssima regulamentação, a lógica criada nas décadas de crise e a visão pueril da Engenharia [Dr. Cristiano Kok (Cascaes)], a boa técnica foi deixada de lado a favor da oferta de menor preço e máximo lucro. Assim temos aprendido a conviver com situações absurdas e ser obrigados a ver obras e serviços ruins, compensados por campanhas publicitárias elogiando as empresas e governos. O resultado, naturalmente, é (não apenas “era”) péssimo, quando não absurdo.
Estamos construindo grandes barragens, mais estradas (diques), pontes, ferrovias etc. e vamos para 4 usinas nucleares.
Será que o povo e o nosso Congresso Nacional discutiu tudo isso com profundidade e sabe o que está fazendo?
Errar é humano, repetir erros é burrice, talvez suicídio.
Cascaes
3.4.2011

Fukushima I nuclear accidents. (2011). Fonte: Wikipedia, the free encyclopedia: http://en.wikipedia.org/wiki/Fukushima_I_nuclear_accidents
Cascaes, J. C. (s.d.). Degradação de obras brasileiras e os projetos. Fonte: Ponderações engenheirais: http://pensando-na-engenharia.blogspot.com/2011/01/degradacao-de-obras-brasileiras-e-os.html
Congresso e Poder Executivo Federal. (s.d.). Lei 8.666 de 21 de junho de 1993. Acesso em 12 de 12 de 2010, disponível em Presidência da República Federativa do Brasil: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8666cons.htm
Gustavo Santos Masili, R. J. (s.d.). USINA NUCLEAR. Acesso em 4 de 3 de 2011, disponível em FEM, Faculdade de Engenharia Mecânica da Unicamp: http://www.fem.unicamp.br/~em313/paginas/nuclear/nuclear.htm,
Nícoli, I. G. (s.d.). O ACIDENTE DE GOIÂNIA. Acesso em 4 de 4 de 2011, disponível em DISASTER - info: http://www.disaster-info.net/lideres/portugues/brasil%2006/Apresenta%E7%F5es/Iedaacidentegoiania01.pdf

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