sexta-feira, 16 de julho de 2010

Trens e arenas

A necessidade de satisfazer os caprichos dos cartolas da FIFA está provocando uma agitação interessante no Brasil e em Curitiba, pois seremos sede de alguns jogos desse evento “esportivo”.

Afinal, como separar o joio do trigo? O que realmente é importante, oportuno e inevitável? Qual é a autoridade técnica dos responsáveis pela FIFA para dizerem para nosso governo o que deve ser feito para atender alguns jogadores e os turistas que virão torcer por seus times?

Teríamos outras prioridades?

Vamos pagar essas contas de que jeito?

Obviamente projetos dessa espécie são a delícia de certos profissionais, empreiteiros e fabricantes. Estamos atrasados em tudo, inclusive na formação de bons arquitetos, urbanistas, engenheiros, técnicos etc. para o volume de obras que o Brasil precisa, com ou sem a Copa. A crise que nos derrubou no início dos anos 80 do século passado foi um pesadelo que durou décadas. Agora parece que teremos uma folga, que não deveremos usar para outro mergulho, ou seja, está na hora de sermos prudentes.

O Brasil é um país que tem um custo adicional gigantesco em seus produtos para consumo interno e exportações por falta de infraestrutura de transportes, silagem, portos e aeroportos etc. e leis que geraram uma tremenda burocracia. Nossas cidades estão rodeadas de favelas e nelas a mobilidade é um pesadelo. O saneamento básico ainda não atingiu níveis razoáveis, o povo reclama, com razão, dos problemas de atendimento em serviços essenciais. Carecemos de boas escolas, creches, áreas para esporte amador, postos de saúde... A segurança não existe, é um pesadelo que só faz crescer. As dificuldades acontecem até no uso da internet, cara e precária. Nesse cenário, quais são as nossas prioridades, cuidar da Copa do Mundo para mostrarmos o que não somos?

Obviamente o futebol é uma paixão brasileira e o prazer de ver nossa seleção jogando justifica muito esforço, mas quanto?

Vimos nessa Copa de 2010 jogadores profissionais que já falam português com sotaque, estão esquecendo a língua pátria, o hino nacional nem se fale... Pagos a peso de ouro, a maioria já emigrara para dar espetáculo em outros continentes, voltarão? São apaixonados pelo Brasil?

O aspecto positivo da intenção de realizar a Copa do Mundo e as Olimpíadas foi mostrar a precariedade da infraestrutura existente para o transporte, acolhimento, segurança e conforto de pessoas, que deve melhorar muito na visão dos especialistas copeiros. Não chama atenção, entretanto, para a necessidade de estrutura para a produção, exportações, importações, tecnologia e serviços essenciais, assim como não entra no mérito da acessibilidade, do respeito às pessoas com deficiência. Afinal, quem pretende freqüentar arenas é uma parcela pequena de fanáticos, que se propõem a qualquer sacrifício para ver jogos. Os apostadores podem exercer seus vícios via internet, já não precisam viajar, e os torcedores mais comodistas têm as telinhas diante das quais poderão tomar cerveja e comer salgadinhos gritando e pulando, talvez rezando por seus times.

Como vimos no Seminário Nacional “Investimento Público: análise e perspectiva” em 9 de julho de 2010, em Curitiba, promoção do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Paraná (Senge-PR), da Federação Interestadual de Sindicato de Engenheiros (Fisenge) e do Departamento Intersindical Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) e com o apoio do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado do Paraná (Crea-PR) falta tudo, inclusive certezas em relação ao futuro da economia mundial e nacional (vide o blog http://economia-engenharia-e-brasil.blogspot.com ).

É momento de prudência. O acidente da “British Petroleum / Deepwater Horizon” possui no nome da plataforma desastrada, por coincidência, o sugestivo “Horizonte das Águas Profundas”, que deve, com este desastre colossal, criar regras mais rígidas nesse tipo de aproveitamento. Qual a expectativa em relação ao Pré-Sal?

Com certeza todos os esforços razoáveis devem ser tomados pelos responsáveis pela Copa do Mundo de 2014, loucuras? Não! Já pagamos caro demais por erros ufanistas do passado, está na hora de mostrarmos ao mundo, acima de tudo, que nosso povo evoluiu e não aceita mais desperdícios. Se o anúncio e projeto do trem bala entre Campinas e Rio de Janeiro traz a expectativa de otimização de aeroportos e transportes, outros simplesmente aparecem sem consistência, frutos do açodamento ingênuo diante da pressão que se instala nesse país, que já perdeu tantas copas ganhas...



Cascaes

14.9.2010

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