terça-feira, 3 de agosto de 2010

Ferroeste, ALL e o Paraná

Há alguns anos o Brasil decidiu privatizar suas concessionárias e estatais em geral (siderúrgicas após um enorme investimento para modernizá-las, por exemplo). O processo foi confuso e alguns geraram escândalos monumentais. Ficamos com pedágios absurdos, menos linhas férreas em operação, serviços precários e apagões. Alguém poderá e será justo dizer: estaríamos melhor em ambiente estatal? Infelizmente o Governo demonstra uma fraqueza monumental de lidar com as corporações sindicais, os peritos do INSS que o digam. Esse “direito de Greve” que mais se assemelha à mais odiosa chantagem possível e uma legislação desinteligente contra as estatais (Lei 8666, por exemplo) e pessoas nem sempre recomendáveis em cargos importantíssimos levam-nos a pensar: o que será menos ruim?

De qualquer forma algumas estatais foram salvas do turbilhão privatizante, dando-nos a esperança de que tenham sensibilidade total aos interesses do maior acionista delas, o povo que as controla.

O nosso estado é um bom exemplo de tudo o que pode acontecer de bom e de ruim em qualquer cenário.

No Paraná a RFFSA tinha a sua melhor regional, isso não impediu que o Governo federal a privatizasse de uma forma estranha, pois, parece-nos que assim lemos, o patrimônio continua da União e o material operacional, rodante, e alguns imóveis passaram para a ALL, pois o material operacional, rodante, e imóveis foram apenas arrendados por 30 anos. Como fica a manutenção?

Nessa lógica fernandina de privatização o Banco Mundial investiu U$ 240 milhões na ferrovia, antes da privatização da Regional Curitiba, deixando as concessionárias usufruírem da modernização...

Os paranaenses sentiram toda a violência do novo modelo com a necessidade de pagar pedágios absurdos, perdendo os serviços da RFFSA e mantendo mal seu porto em Paranaguá. Ou seja, o lado ruim de tudo.

O debate volta aos poucos em torno da Ferroeste. Qual é a situação real dessa empresa estatal? Pode investir, melhorar seus serviços? O que foi feito nas gestões anteriores de bom ou mal? Parece que enquanto isso os produtores de soja deixam de ganhar um dólar por saca de soja se ela fosse trazida do oeste do estado para o litoral em composições ferroviárias. Qual é a produção exportada? Isso significa quanto de perdas? O IBGE prevê uma safra em torno de 13 milhões de toneladas de soja no Paraná (sacas de 60 kg), fora outros cereais, ou seja, admitindo que 70% seja exportado só por aí o estado onera o produtor em 150 milhões de dólares por ano.

E a ALL, está bem financeiramente? Pode e quer investir no Paraná? Quando? Quanto? De que jeito? Compete bem com os caminhões?

Vemos o tempo passando e, aliás, em ferrovias podemos nos orgulhar de atos distantes e erros incríveis, que inviabilizaram o projeto de meio século atrás para o novo trecho entre Curitiba e Paranaguá (executado parcialmente). De 1995 para cá, contudo, a história ficou travada ou regredindo.

Discussões exotéricas podem voltar. Podemos alugar trilhos? Vamos mudar o modelo institucional? O drama é a perda de nossos trabalhadores rurais (empresários e operários) que todo ano deixam de ganhar recursos para novos investimentos ou, entre outras coisas, simples lazer porque gastam demais com o transporte do que produzem.

Vale sempre a provocação: se para um mês de Copa do Mundo de 2014 vale tanto esforço, por quê não pensarmos mais e melhor sobre a infraestrutura estadual?

Felizmente as entidades de classe estão fazendo propostas, estudando, levando aos candidatos sugestões pensadas com certa maturidade. O fundamental é a disposição do próximo governo e representantes no Congresso de se dedicarem ao estado de forma objetiva, eficaz.

O Paraná perdeu muito esperando soluções propostas e até iniciadas (inconclusas) há décadas. Da duplicação da rodovia para São Paulo ao programa de transportes ferroviários, estamos comendo poeira de muitos estados mais hábeis política e administrativamente.

Acorda Paraná.



Cascaes

3.8.2010



P.S.:

De um amigo bem informado transcrevo:

O Paraná precisa construir 1000 km de novas linhas o que daria uns 3 bilhões de reais de investimentos. De Curitiba a Paranaguá, trecho de piores condições para execução da obra, investimento em torno de 500 milhões para fazer os 105 km necessários.

O custo do transporte por ferrovia é da ordem de 30 % menor. Se a ferrovia for pública o repasse do desconto no frete deve ser próximo disso.

Distância de Cascavel à Paranaguá - 740 km. O pedágio rodoviário foi incorporado na planilha do frete ferroviário assim que foram inaugurados. A participação do modal ferroviário na movimentação total das cargas da APPA deve estar na ordem de apenas 30 %.

Com a nova linha poderia dobrar esse percentual, mas, para tanto, teriam que ser construídos mais armazéns, pois hoje os caminhões servem de depósito (pulmões). Esse investimento não precisa ser público, pode ser dos donos das cargas.

À administração do Porto caberia aumentar pontos de carregamentos.

2 comentários:

  1. Luis Eduardo Knesebeck4 de agosto de 2010 às 04:58

    Cascaes.

    Enquanto no Paraná discutimos alternativas, como o seu artigo, e conhecemos problemas, como a gestão na Ferrosul, São Paulo vai em frente e inclue no seu TAV – Trem de Alta Velocidade a ligação com Campinas.

    Será que foi devido ao aumento da demanda em Viracopos?

    Esta inclusão, questionável sob meu ponto de vista, só beneficia Campinas. Olhando um pouco além de crescimento urbano que ocorrerá nesta cidade, este projeto alcança excepcional amplitude. De imediato tende a reduzir o afluxo a região paulistana, pelo aumento no uso do aeroporto e desafogo de Congonhas. Mas não é só isto: ao proporcionar uma ligação de alta velocidade com o Rio de Janeiro, insere esta terceira cidade em um gigantesco pólo econômico (São Paulo e Rio de Janeiro), enorme em qualquer uma das dimensões que se queira comparar. Serão cerca de 30 milhoes de habitantes conectados por um meio de transporte “econômico” (??), na verdade uma gigantesca canaleta de transporte ultra-rápido. Quais as implicações desta integração a longo prazo?

    E no Paraná? Já comentei dias atrás a visão, que aparece no seu artigo, de substituir a nossa centenária via férrea Curitiba – Paranaguá. Indo além, compartilhamos a mesma visão de futuro, onde o Paraná ocupará verdadeiramente seu espaço no Mercosul, comunicando nosso porto com a fronteira em Foz do Iguaçu, via férrea e permitindo extraordinários benefícios, não só no transporte de cargas, mas também no incremento do turismo.

    Mas para isto, é preciso muito trabalho! E não depende dos outros, mas sim de nós mesmos.

    Luis Eduardo

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  2. Cascaes,

    Vamos lá…ontem dei com os burros n’água ao tentar postar e perdi meu comentário...foi um daqueles entraves tecnológicos, mas é o seguinte:

    Em primeiro lugar não sou especialista em transporte de carga, mas como trabalhei no projeto da ferroeste (RIMA), me sinto apto a fazer o seguinte comentário: - Na época do projeto, já víamos um sério entrave a o funcionamento como um todo do corredor de exportação, que era (e é) o trecho de Curitiba a Paranaguá. Estrada secular, concebida em outros tempos e nada afeita ao transporte que se propõe a ferrovia que se pretende com a ferroeste.

    Vimos em 2004, se não me falha a memória, um sério e comprometedor acidente (com a ALL), no viaduto sobre o rio São João, com conseqüências ambientais absurdas e que naqueles momentos do projeto, já se comentava a possibilidade de ocorrência.

    No seu comentário, gostaria de ressaltar duas coisas bastante interessantes:

    1ª) Não podemos atuar pensando em “copa do mundo”. Essa mentalidade de investir porque vem uns poucos milhares de turistas ver 3 partidas e deixar mil dólares cada um deles, não pode ser bandeira de políticas sérias de governo.

    2ª) temos que urgentemente separar as pautas de políticas de transporte de passageiros e de cargas. Ambas necessitam investimentos que não só no setor rodoviário. Temos que tentar afastar os interesses exclusivistas da Petrobrás e das montadoras (e também das grandes empreiteiras) no que se refere à construção e favorecimento exclusivo de estradas e do automóvel (ou caminhão). O transporte como o de grãos, por exemplo, é coisa para ferrovias e hidrovias ou navegação de cabotagem, que em qualquer destes casos, reduziria os custos do transporte.

    Assim, políticos oportunistas e manchetes internacionais como gol do Kaká, podem render mais atrativos ao transporte do que uma safra de soja, em um país como a pindorama...

    Abrazos,

    rg

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