domingo, 27 de março de 2011

Violência explícita ou implícita

Violência explícita ou implícita
Sobreviver em florestas, savanas e até em desertos hostis fez do ser humano, em sua origem (Homo sapiens), um mamífero agressivo, violento e forte para vencer dificuldades que reduziam drasticamente sua expectativa de vida e o desafiavam a cada momento. Aliás, boas coleções de livros merecem atenção para quem aprecia leitura rápida e assim o volume (A aurora da humanidade, 1993) é uma boa fonte de consulta e ilustração desses milênios selvagens, apesar das novidades que só via internet conseguimos acompanhar.
Felizmente os tempos mudaram, mas os arquétipos existem, nem sempre saudáveis. A violência incrustou-se na Humanidade e se revela em inúmeros detalhes e comportamentos. O estranho nessa situação é a aceitação do sofrimento de forma semelhante à de provocá-lo.
Tentando não usar termos técnicos, normalmente criados e apropriados por especialistas, vamos evitar palavras complexas, mas abusar do verbete “sadomasoquismo”. Se existe algo nítido e de fácil percepção é a disposição das pessoas de submeterem sofrimentos aos outros e a elas próprias, deliberadamente, demonstrando, nas expressões corporais e faciais que sentem prazer em agir assim, principalmente em agressões a terceiros, com alegria mais do que evidente em atos de triunfalismo ou simples satisfação de maltratar.
Ao longo da vida, principalmente naqueles que se expuseram a pregadores políticos e religiosos, agora aos “esportivos”, vemos essa atitude sadomasoquista, que chega a absurdos incríveis. No Governo a política econômica é o paraíso desse cenário patológico.
Mais intrigante é a atuação do Governo, quando decreta triunfalmente e o povo aceita, até aplaudindo, cortes monumentais no orçamento (preservando o futebol) que faltarão a serviços essenciais degradados, matando centenas de milhares de brasileiros todos os anos. Se em questões de foro íntimo tais como religiões e convicções políticas devemos respeitar atos impensados, desde que não sejamos as vítimas dos mártires, quando vemos o governo anunciando ações enérgicas de contenção de despesas para segurar uma inflação provocada por ele mesmo, e ser aplaudido por isso, aí realmente só a aceitação de alguma patologia intelectual poderá explicar os aplausos de “especialistas” e o espaço glorioso que ocupam na mídia formal.
A desinteligência humana é um espanto (lembrando um quadro do Jô Soares (Frases Verdadeiras – Jô Soares)), não se podendo deixar de citar Hannah Arendt e seu livro “A Vida do espírito” (Arendt, 2009), quando, na página 89 ela afirma categoricamente que o ser humano de forma geral não pensa e explica possíveis razões para isso. Ou seja, uma tremenda pensadora, uma personalidade genial da Humanidade em sua última obra, suponho, escreveu isso para ninguém ter dúvidas.
A desinteligência é universal. Para compensar e criar vultos eméritos temos muitas formas, desde algumas mais do que justas até outras totalmente artificiais, supérfluas, inúteis e ridículas. O fundamental é o cartão de visitas, as logomarcas bem feitas, o layout bonito e textos e cores agradáveis, ainda que eventualmente só legíveis com boas lupas.
Com certeza os grandes mestres dessa espécie de vida sabiam disso. Assim criaram rituais e preceitos, alguns impondo sofrimentos e outros prometendo alegrias, mas o fundo sadomasoquista é visível em inúmeras religiões, seitas, credos políticos e paixões esportivas.
Vendo reportagens sobre bullying, lembramos da nossa infância e juventude e agora observamos os mais velhos. Nascemos crianças e morremos de forma infantil, se vivermos o suficiente. O que o bullying tem com isso? No egoísmo exercitamos agressões e fomos agredidos, na velhice sentimos que devemos cuidar mais da gente, e aos poucos esquecemos os problemas dos outros. Talvez isso explique a forma tranquila de agressão por parte de líderes que já foram melhores, aproximando-se da morte...
O que é preocupante, nessas digressões, é o sadomasoquismo dos poderosos. Por aí poderemos ter tragédias evitáveis (Cascaes), como vimos uma sucessão delas nesses últimos três anos, e violências e atitudes absurdas denunciadas até pelos banqueiros em relação a ditaduras antigas no norte da África.
O que realmente precisamos é de pesquisas, avaliações e propostas educacionais sérias para a inibição de sentimentos agressivos contra todos, inclusive nós mesmos. Infelizmente as piores armas de destruição existem. Desprezando mosquitinhos, como vimos no caso da dengue no Brasil, deixando milhares de crianças abandonadas nas ruas das cidades (Carriel, 2011) ou condenando parte da população a viver de catar lixo, temos muito o que mostrar sobre um comportamento que nossos grandes e melhores pregadores filosóficos e religiosos tentaram inibir sem sucesso.
A violência é óbvia e fator de prazer para as elites, que se divertem com povos submissos...

Cascaes
22.3.2011
Arendt, H. (2009). A Vida Do Espírito. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira.
Carriel, P. (2 de 3 de 2011). 23 mil crianças ainda vivem nas ruas do Brasil. Gazeta do Povo.
Cascaes, J. C. (s.d.). Acesso em 28 de 1 de 2011, disponível em Mirante da Defesa Civil: http://mirantedefesacivil.blogspot.com/
Homo sapiens. (s.d.). Fonte: Atlas Virtual da Pré-História: http://www.avph.com.br/homosapiens.htm
Mairink. (s.d.). Frases Verdadeiras – Jô Soares. Fonte: OM - Tudo de Bom Para Você: http://www.opiniaodomau.com/2010/09/frases-verdadeiras-jo-soares.html
Marie-Louise Collard, T. F. (1993). A aurora da humanidade (Vol. 1). (A. Livros, Ed., & P. P. Poppovic, Trad.) Rio de Janeiro: Time-Life Livros.

Nenhum comentário:

Postar um comentário