Em Blumenau, garoto nos anos cinquenta, uma de minhas distrações era ir ver o trem. Ficava impressionado observando aquelas máquinas na estação da Itoupava, perto do Centro Espírita (“Fé, Amor e Caridade”, se não me engano). Nas pontes de ferro e noutra de arcos e concreto em “minha cidade” ainda podia ver o lagartão passando, soltando fumaça e fagulhas. Uma festa era viajar de trem, devagar íamos vendo as maravilhas do Vale do Itajaí e brincando nos corredores da composição.
1977 foi um ano muito especial para mim. Participei de uma missão a oito países (Europa e América do Norte) para conhecer indústrias e o estado da arte em subestações blindadas e isoladas em SF6 (Usina de Foz do Areia em construção). Mais uma vez tive contato com trens, mais velozes e confortáveis e que me deram uma paixão adicional pelas músicas do conjunto Kratwerk [ (Kraftwerk) (Wikipédia)], a Trans-Europa Express (1977) que reproduzia muito bem os ruídos, que ouvíamos naqueles tempos em que viajar de trem pela Europa tinha o charme da velocidade certa, ou seja, podíamos ver e sentir melhor um continente incrível e cheio de surpresas.
Ainda em 1977 ficamos surpresos vendo o trabalho de pesquisa e desenvolvimento que a Siemens fazia em Erlangen, Alemanha, para dominar a tecnologia da suspensão eletromagnética num lugar que parecia um estádio de futebol, testando protótipos (Siemens).
No Brasil, a pedido da esposa (Gilda) de um amigo (Juracy Rezende de Castro Andrade) procurei entender mais sobre trens de alta velocidade. Meu salvador foi o mano Flávio Gaspar, engenheiro da RFFSA, que passou a me emprestar regularmente revistas especializadas no assunto (altíssima tecnologia). A complexidade e a imensa quantidade de detalhes técnicos e cuidados necessários nos projetos em operação, em execução e em estudos deram-me uma visão diferente dos trens modernos.
Em 1988 voltei a visitar fábricas, agora para conhecer mais sobre bondes e metrôs (por conta do governo francês). Em Lyon, muito especialmente, vi os cuidados com o automatismo do controle das máquinas, capricho total. Ainda naquele ano ouvi de um executivo a preocupação francesa em fechar o maior número de contratos possíveis antes que as regras da Comunidade Europeia impusessem novas formas de competição...
Na Europa é possível ver, além dos trens de passageiros, os trens de carga, composições gigantescas tirando das estradas uma quantidade imensa de carga além dos antigos e maravilhosos canais, interligando rios, lagos e portos.
Aeroportos gigantescos completam um cenário que nos permite viajar por aquele continente de muitas maneiras, sem as loucuras do Brasil, que já foi vítima da monocultura agrícola e que agora sofre com a dependência radical do transporte rodoviário, ou seja, diversificamos a agricultura e concentramos o transporte terrestre no sistema mais caro.
Para completar a insanidade a RFFSA foi extinta (quando poderia ser modernizada, aprimorada e até vir a ser uma PPP equilibrada, inteligente) e agora sofremos com a falta dos trilhos, felizmente retomados pelo governo Lula, longe, ainda, do mínimo necessário. Em alguns casos sentimos outras formas de regressão, como, por exemplo, o que descobrimos ter acontecido com a Ferroeste, é de doer.
No Paraná, outro amigo especialista em trens, Paulo Ferraz, disse-me que investimentos em torno de quatro bilhões de reais seriam necessários para corrigir a malha ferroviária existente aqui, deixando-a operacional com eficácia.
Nessa reentrada nos trilhos precisamos, contudo, não sair por aí importando tecnologia sem maiores negociações. O Brasil é grande demais para não ter um parque industrial ferroviário próprio. É uma questão de segurança tão importante quanto fazer tanques e aviões militares.
Refazer o que foi perdido e acrescentar mais linhas significarão investimentos colossais. Felizmente nosso país é rico por natureza e agora estamos começando a explorar em nosso benefício o que existe por aqui. O perigoso é que também demos demonstrações de ingenuidades terríveis...
Diante de tudo isso e para não perdermos a racionalidade impõe-se um planejamento minucioso de todos os modais, cálculo absolutamente honesto de custos e benefícios e um escalonamento criterioso de investimentos aliados a uma política de criação de indústrias e pesquisa e desenvolvimento no Brasil.
Ver a Europa quebrando, reduzindo benefícios sociais, regredindo aos tempos fascistas etc. por ter gasto demais sem muitos cuidados é um alerta fortíssimo ao nosso povo.
Cuidado ao repor os trens nas linhas...
Cascaes
8.1.2011
(s.d.). Acesso em 8 de 1 de 2011, disponível em Kraftwerk: http://www.kraftwerk.com/
Siemens. (s.d.). Trem com menor consumo de energia é a proposta da Siemens para as ligações regionais. Acesso em 8 de 1 de 2011, disponível em Siemens: http://www.siemens.com.br/templates/v2/templates/TemplateClippingDetail.Aspx?channel=10260&id=31
Wikipédia. (s.d.). Kraftwerk. Acesso em 8 de 1 de 2011, disponível em Wikipédia, a enciclopedia livre: http://pt.wikipedia.org/wiki/Kraftwerk
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