O
livro ([org.],
Foucault - a coragem da verdade) traz o que Michel
Foucault entende e defende como “parrhesia” (pgs. 59 e 60):
“A parrhesia é um tipo de atividade
verbal na qual o falante tem uma relação específica com a verdade por meio do
falar francamente, uma certa relação com sua própria vida por meio do perigo,
um certo tipo de relação consigo mesmo ou com os outros por meio do criticismo
(crítica de si ou de outrem), e uma relação específica com a lei moral por meio
da liberdade e do dever. Mais exatamente, a parrhesia é uma atividade verbal na
qual um falante exprime sua relação pessoal com a verdade e arrisca sua vida,
pois considera que o dizer verdadeiro é um dever em vista de melhorar ou ajudar
a vida dos outros (assim como ele faz consigo mesmo).”
Dizer
a verdade significa muito, pois na “Academia”, nos partidos políticos e
organizações religiosas lideranças e mestres criam muitos conceitos e preceitos
humanistas estabelecendo proposições e comportamentos que são autênticos dogmas
modernos.
Se
antes as religiões impunham crenças, agora defensores dos Direitos Humanos,
principalmente, usam e abusam de forma irresponsável de conceitos e afirmações
que talvez não se sustentem na vida em geral.
Para a
sobrevivência individual e geral é fundamental o exercício da verdade de forma
radical, a começar pelo conhecimento profundo de nós mesmos (ver a história da
Escola Cínica e Diógenes Dion nas obras de Michel Foucault).
Crenças
e afirmações precisam de coragem, convicções que em casos extremos poderão
desmoralizar quem as propõem veementemente. Acima de tudo precisamos saber até
onde estamos dispostos a lutar e fazê-lo com a convicção necessária e
suficiente, sempre lembrando que poderíamos ter feito outras opções melhores,
mais próximas da vida real, justa e necessária.
Com
certeza muitas guerras não teriam acontecido se os soldados antes pensassem e
soubessem o que teriam que enfrentar. “Bons líderes” estimulam o otimismo,
falam de honrarias, heroísmo, etc. Eles, contudo, normalmente se escondem,
ficam protegidos, afinal se enxergam tão importantes que não poderão se expor.
Isso vale em muitas situações, principalmente na vida pública onde políticos
mais “espertos” convocam seus admiradores a atos radicais, ficando à espreita
dos resultados para poderem escolher o momento de entrar em cena (Cascaes).
Somos
seres mortais em um imenso teatro, mas na realidade viajamos sempre, vivemos
corrigindo e mudando personagens. É hipocrisia afirmar “sempre fui assim”. Não mudar de acordo com nossos sentimentos de
segurança e instinto de sobrevivência poderá ser extremamente doloroso.
Em
tempos de censura feroz o ideal é viver em círculos restritos, desenvolver
técnicas de silêncio pois a exposição tem muitos riscos, lamentavelmente a
vigilância do Estado é mais e mais necessária com o crescimento do
fundamentalismo religioso.
Giordano
Bruno (Montaldo, Volonté e Rampling,
Giordano Bruno)
foi um exemplo magnífico dessa condição e durante o último período militar no
Brasil tivemos modelos de diversos comportamentos, entre eles o de um político
famoso nesses últimos anos que praticamente viabilizou o desmonte do pessoal
que se preparava para a luta no Araguaia (Morais e Silva).
Nada
pior do que o arrependimento tardio. O correto é saber evitar situações que de
antemão saibamos serem insuportáveis.
Em
casos extremos devemos raciocinar como passageiros, oficiais, marinheiros em um
grande navio enfrentando tempestades e finalmente afundando, como agiremos
realmente?
Qualificar,
classificar, entender e se relacionar com seres humanos é essencial à nossa
sobrevivência, afinal, que significado teria para nós o planeta Terra e a Humanidade
se vivêssemos em outro planeta de outra constelação?
O
pragmatismo é necessário a quem deseja viver com tranquilidade. Caso contrário
a vida será provavelmente mais empolgante, será um esporte radical, devemos,
contudo, saber escalar e descer montanhas.
Teorizar
é fácil para aqueles que não têm responsabilidades executivas, de comando e
gerenciamento.
Vemos,
lemos e ouvimos “conselhos de especialistas” que simplesmente não servem para
nada em situações de grande responsabilidade.
E o
ser humano é fruto de seu ambiente, história, acidentes, incidentes, saúde,
educação, etc. Coleções de indivíduos que denominamos famílias, tribos, nações,
raças e outras coisas trazem consigo uma série de fatores que os personalizam,
singularizam.
O
corpo humano e sua forma de pensar e agir formam uma máquina excepcional,
merecendo muito cuidado ao ser avaliado, muito mais em aglomerações
aleatórias...
Existem
diferenças.
O
desafio é a evolução, em que sentido?
As
guerras mundiais e todas as outras (passadas, presentes e futuras) mostram a
fragilidade de nossa inteligência. Argumentos absurdos geraram genocídios, campos
de concentração, crematórios e holocaustos, diásporas, refugiados desesperados,
experiências e matanças inacreditáveis há pouco tempo. Vamos ver a repetição
desses eventos se não pudermos transmitir aos mais jovens sentimentos de fraternidade
e solidariedade.
As
ferramentas para educação têm alcance mundial, o pesadelo, contudo, é que
transmitem padrões diversos, frequentemente contraditórios, pois só quem
lecionou sabe como os alunos podem se fixar em detalhes irrelevantes.
As
grandes religiões e ideologias são os melhores exemplos possíveis. Belíssimos
ensinamentos e conceitos ganham rituais, formalismos e enfeites, dando ao
crente a sensação de respeito quando seus pensamentos e atitudes demonstram o
contrário.
A
censura é algo extremamente perigoso, mas a própria liberdade é relativa.
Infelizmente
a hostilidade recíproca cria fortunas. O exemplo mais absurdo e comum entre nós
é o das torcidas em torno de clubes de futebol. Empresas com profissionais que
jogam, se bem pagos, motivam autênticas guerras que fazem a delícia de certo
tipo de comentarista e empreendedor de futebol. Afinal, não fosse a paixão, que
emprego teriam?
Admitir
as diferenças e saber aproximar positivamente as pessoas é o desafio do século
21. Todos são importantes na luta pela sobrevivência das nações.
O
que, entretanto, merece análises é até onde podemos aceitar teses humanistas e
desprezar a realidade eventualmente degradante e agressiva?
O ser
humano desde que surgiu age e reage contra tudo e todos, assim a evolução
aconteceu até chegarmos ao nível em que estamos. Em qualquer espaço geográfico
encontraremos pessoas com crenças e comportamentos nem sempre aceitáveis (e
vice e versa). A intolerância explode em casos extremos.
O
recrudescimento do terrorismo padrão século 21 é assustador, mais ainda diante
da tremenda fragilidade estrutural de cidades e tudo o que existe para
mantê-las. Muitos não percebem detalhes críticos e seria imprudente chamar a
atenção do que é possível. É justo, portanto, estabelecer limites, critérios,
padrões de vigilância e limitações lamentavelmente necessárias.
Refugiados
aos milhões migram de qualquer jeito, mas trazendo culturas e vontades
eventualmente incompatíveis com os lugares onde se instalarem. Durante toda a
história da Humanidade esse foi um processo darwinista crudelíssimo.
Em
cálculo, lógica e em filosofia podemos demonstrar teses e equações “por
absurdo” (Curvello), nos limites
extremos. Levando variáveis ou parâmetros a valores elevados ou minimizados, ou
com situações contrárias à rotina poderemos ver se a tese se mantém. Assim, por
exemplo, seria o caso de perguntar se qualquer família aceitaria ser vizinha de
talibans, canibais ou agrupamentos de pessoas sem respeito ao que tiverem...
Encontramos
muitos radicais de mesa de bar que não calculam nem medem as consequências do
que afirmam.
Tudo
tem custos e benefícios.
A
radicalização de Direitos Humanos deve ser acompanhada pelas obrigações, os
deveres de qualquer cidadão, família, comunidade e até clubes esportivos, ONGs,
governos etc.
O
discurso fácil e comum é assumir a postura simpática, agradável a quem ouve. O
desafio, principalmente em sistemas democráticos, é saber o custo das decisões
em todos os sentidos.
Com
certeza os deveres mais universais serão o da própria sobrevivência e a partir
daí os sentimentos e ações de amor ao próximo, respeito, fraternidade. Nada é
absoluto e cada unidade pensante precisa decidir. A liberdade é fruto da
responsabilidade social, se não fosse assim já teríamos desaparecido da
superfície terrestre.
Precisamos
discutir com isenção de espírito cada situação que põe em risco a nossa
sobrevivência, afinal é um direito natural, essencial à vida. Não se trata de
pagar o passado, nenhum povo é inocente e se valem certas teorias somos todos
descendentes de poucos animais. O que precisamos saber, entender, negociar,
propor e praticar é a solução para o cenário atual e futuro. O passado serve
como base de experimentos e estudo de comportamentos.
Com
facilidade podemos sentir o espírito de estudos, livros, discursos e propostas
equivocadas, ainda que extremamente sintonizadas com as melhores intenções.
Normalmente os temas mais sensíveis são desprezados. Isso é ruim, perigoso.
Temos conquistas que não podem ser perdidas por atavismos humanitários...
O
desafio dos teóricos e ativistas é dimensionar suas teses e vontades.
Cascaes
Curitiba, 22.7.2016
Nenhum comentário:
Postar um comentário