Paradigmas modernos
Participamos
de uma inspeção de um prédio; entre nós um senhor humilde e malvestido era o
mestre pedreiro que apoiava os engenheiros e vendedores. Aparentemente ninguém
se interessou pela personalidade, pela vida daquele senhor que construiu a
partir do zero uma carreira honesta, com certeza inúmeras vezes arriscando sua
vida. Seu salário? Não tivemos coragem de perguntar, deve ser ridículo em
relação à importância de suas atividades.
Será
que seus filhos sabem quanto o pai é valoroso?
O
Ministério do Trabalho e os sistemas de saúde têm estatísticas dos heróis do
trabalho. Anualmente, principalmente pelo desprezo de seus patrões, centenas de
milhares de brasileiros sofrem acidentes graves, morrem ou ficam com lesões
permanentes em atividades de risco e insalubres. Formam um contingente de
heróis na luta pela construção do Brasil, existe algum monumento ou praça, ou
museu dedicado ao trabalhador anônimo que fez, constrói e trabalhará pelo
Brasil?
As
lutas ideológicas e principalmente o pavor das elites de que o cidadão honesto,
comum, trabalhador e dedicado a uma profissão produtiva ganhe destaque explica
muito da alienação a seus valores. Ao contrário, interessa a quem manda a
alienação, a dispersão de atenção fora do horário do trabalho.
Até
poucos tempos passados só os profissionais das guerras imperialistas mereciam
respeito, afinal davam a vida em favor dos interesses alheios às suas
necessidades...
Felizmente
os tempos mudam. Atualmente em qualquer residência os seres humanos descobrem a
importância do bom eletricista, encanador, pintor, do artífice ao profissional
de nível superior que falhando transformará a vida da família em um pesadelo.
Em
países mais desenvolvidos descobrimos museus fantásticos dedicados ao trabalho,
à tecnologia, ao resultado de inovadores, inventores e sábios. As bibliotecas e
museus tecnológicos são templos do conhecimento e dentro deles encontramos
trabalhos interessantes e guias escolares mostrando a seus alunos o que
encontram e explicando para quê existem.
De
qualquer maneira o famoso “mercado” descobriu que a contracultura dá dinheiro,
principalmente se dirigida aos jovens.
Vivemos
uma época em que a grife ganhou uma importância tão grande que até nossas
madames gostam de servir de outdoors. Jogadores, esportistas e atletas ostentam
marcas de produtos industrializados. Os patrocinadores da mídia viabilizam
programas imensos e vazios. Os especialistas em merchandising trabalham para
esvaziar as mentes e encher os corações de banalidades.
O que
nos preocupa é o que constatamos pessoalmente fazendo enquetes em bairros mais
humildes: a maioria dos jovens quer ser jogador de futebol. E se não forem?
Continuarão fascinados com as riquezas e poderes de seus ídolos? Pensarão em
outras profissões? Terão orgulho de suas opções não esportivas? Serão
competentes? Vão aderir ao ganho fácil da criminalidade?
Parece
que instintivamente percebem, gradativamente e talvez tardiamente, que poderão
ser tão vazios quanto as bolas que chutam. A vida adiante dará um choque de
realidade e a percepção do tempo perdido.
Precisamos
promover a honestidade, não?
As
manifestações contra a corrupção ganham força e esperamos que continuem se
avolumando. Mais importante seriam atos de vergonha nacional; o dia da vontade de trabalhar merece ser criado.
Que as profissões, trabalhadores e suas corporações já com dias consagrados
gastem esses momentos promovendo suas carreiras, especialistas, seus heróis e
mártires.
Exemplificando,
sempre que passamos por Itajaí, Santa Catarina, lembramo-nos do cidadão que
morreu fechando válvulas de um terminal de gás que, incendiado, explodiria boa
parte da cidade. Será que seu nome é relembrado anualmente?
No
Setor Energético colecionamos vítimas. Os museus das concessionárias não fazem
referência a esses heróis...
Algum
sindicato tem galerias e museus mostrando seus grandes profissionais e suas
qualidades? Quando muito aparecem em revistinhas de uso exclusivo dos seus
associados, quanta alienação!
Nossas
cidades se preocupam em valorizar os bons profissionais? Esquecem que a
notoriedade e seus predicados dependem de idealistas, planejadores,
construtores e operadores excepcionais? Naturalmente existem exceções, são
poucas, contudo.
Com
certeza isso existe, ainda que residualmente. Muitas ruas e praças têm nomes de
professores e de outros trabalhadores, empreendedores e artistas locais; nelas
descobrimos porque assim são denominadas?
Precisamos
de circos, arenas, coliseus e gladiadores, gostamos atavicamente de acreditar
que temos algo em comum com essa gente que corre atrás de um esférico. Ganhamos
anéis de concreto monstruosos. As cidades passam a ter coisas “arquitetônicas”
como se fossem bolhas de insanidade além das famigeradas “torcidas
organizadas”.
Agora
só falta construirmos imensos hospitais, escolas, boas creches e em número
suficiente, fábricas, ateliês, objetos educativos e cidades decentes.
Aproveitando o que precisamos fazer vamos trabalhar para valorizar nossos
cientistas, planejadores, urbanistas, engenheiros etc. Há muito a ser feito.
A
propósito, quem sabe o nome e a vida dos valentes lutadores e pesquisadores
contra nossas endemias? Quem foram aqueles que de fato viabilizaram a
agroindústria no Brasil? Onde estão os nomes dos técnicos e engenheiros que nos
deram a infraestrutura energética de nosso país?
Está
na hora de descobrirmos o Brasil que trabalha, estuda, luta pela construção de
nossas vidas.
Nos
finais de semana, em momentos de alienação saudável e necessária, vamos torcer
pelos nossos times. Cuidado apenas para não engordar comendo salgadinhos e
tomando bebidas alcoólicas, principalmente estas, patrocinadoras dos circos de
concreto e espetáculos que inauguraram.
Nossos
heróis serão modelos para nossos filhos...
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